Qual carro vai para a pista primeiro?

terça-feira, 27 de março de 2012

Se você não aguenta o calor, saia da cozinha.

Uma peça do setor de direção, após limpeza e lixamento, aguardando o acabamento.

Certa vez eu vi na tv um programa onde o John Lingenfelter, aquele dos Corvettes modificados, declarava o seguinte: "As pessoas pensam que querem um carro de corridas para andar nas ruas. Mas na verdade não é isso que elas querem".

A princípio pode parecer uma observação arrogante, mas quando você trabalha com carros e performance durante algum tempo, ela vai se tornando cada vez menos prepotente para soar por fim, como puro senso comum. É preciso mesmo ter muito cuidado com aquilo que se deseja.

Tenho uma amiga, bem empregada, salário justo,  reconhecida pelo chefe... Esses dias ela me confidenciou que estava insatisfeita e cogitando largar tudo para realizar o sonho de trabalhar por conta própria. Um pouco preocupado, perguntei que tipo de negócio ela pretendia montar. "Já ouviu falar em Food Truck?" Ela me perguntou.

Longe de mim querer desmotivá-la na perseguição de seus sonhos, mas alguém tem de fazer o papel de advogado do diabo. Perguntei então se ela tinha pensado em todos os detalhes, como por exemplo o fato de que estaria trabalhando na rua, com todo seu patrimônio exposto, sem segurança, sem ar condicionado, sujeita ao assédio de mendigos, ladrões... Se tinha pensado que, por mais "in" que seja hoje em dia trabalhar com cozinha, ainda é, basicamente... Cozinhar... Todo mundo quer ser "Chef", mas ninguém quer ser cozinheiro. Só esquecem do detalhe de que no fundo é a mesma coisa.

Enfim, não sei que decisão ela tomará, espero que qualquer que seja dê muito certo. Mas o importante dessa história é o ditado: "Se você não aguenta o calor, então saia da cozinha".

Do mesmo modo, como diria o papa dos Corvettes, muitas pessoas acham que querem restaurar um carro, mas na verdade não é isso que elas querem. Hoje em dia tudo aparece bem produzido na tv, tudo é "glamourizado" através de shows, filmes, "realitys"... Mas fora dos programas de culinária ou de oficina, nem sempre as coisas são como a gente vê na telinha.

Quando eu era guri, me meti a reformar um Karmann Ghia. Meti a mão na graxa, fiz várias tarefas eu mesmo, gastei com outras e muitas delas, tanto as pagas como as que eu fiz não ficaram como eu imaginava. A quantidade de trabalho para terminar o carro também foi muito maior do que eu imaginei, mas o pior foram as tarefas em si.

Meu Karmann Ghia 72, alguns bons anos atrás

Quando vemos na televisão uma reforma de carro sempre é dada ênfase nas tarefas mais festejadas, como a hora em que o Mike Lavalee faz aquelas chamas loucas com o aerógrafo, ou quando o Tom Nelson coloca um motor V8 turbo no dinamômetro, acelerando, cuspindo fogo e debitando 2500 cv.

Na vida real nada acontece em uma semana. Não dá pra pintar o carro sem incontáveis horas de lixamento e preparação meticulosos e a montagem de um motor de 2500 cv envolve dezenas de operações de medição e correção em tolerâncias extremamente apertadas. Nos dois casos, trabalhos demorados, difíceis e nos quais não se pode errar por falta de atenção.

Mas mesmo quando não é exatamente o talento que está em questão, existem centenas ou milhares de tarefas que demandam tempo, esforço e capricho, muitas vezes em lugares que nem vão aparecer. Desmontar, lavar, jatear, lixar, tratar, pintar, zincar, catalogar, acondicionar, armazenar...

Quando vendi meu Karmann Ghia, prometi pra mim mesmo que não esqueceria a lição mais valiosa que ele me ensinou: Por mais que eu goste de carros antigos, não gosto de mexer em coisa velha. Não gosto de ferrugem, lata podre, peças oxidadas e carcomidas, borrachas ressecadas, plásticos quebradiços, peças amassadas, vidros riscados... Enfim, acho que já deu para ter uma idéia.

E por mais que um carro 93 como o meu Kadett seja considerado velho hoje em dia, é muito melhor (menos ruim) que um carro 73, por exemplo. Ou 72, como era meu KG.

Assim, por mais legal que seja a gente restaurar algumas peças que pareciam lixo e deixar elas novinhas, isso dá muito trabalho, consome muito tempo e também uma boa quantia em dinheiro. Pode ter certeza, não é como na tv.

Portanto, se você é exigente em termos de acabamento e pretende montar um carro de performance, seja de rua ou de arrancada, mas é vacinado contra o tal "vírus da ferrugem", procure comprar um carro tão novo quanto possível. Será mais rápido e mais barato.





Alguns suportes do setor de direção, o da esquerda eu já dei uma boa lixada

Amortecedor de direção desmontado

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